Hoje foi dia de fazer experimentos mil com água e vapor!
Inspirado pela receita de pão branco super básico do blog Pão com Levedura Natural, resolvi testar uma massa de pão com 70% de água. Na verdade, fiz uma versão da receita básica deste blog com 70% de água, em vez dos 65% máximos. A diferença de água entre uma e outra receita pode parecer pouca, mas já de antemão confirmo que fez a maior diferença, e o pão ficou delicioso!
A receita ficou assim:
300 g de farinha de trigo
1 bolinha de glúten extraída de uma massa lavada de 140 g de farinha de trigo e 84 g de água
120 g de levain
9,5 g de sal (já contando que o levain continha 80 g de farinha de trigo)
210 g de água
Usei três métodos para preparar a massa: primeiro, coloquei na batedeira por cerca de 10-15 minutos – 10 min à velocidade 2-3, 5 min à velocidade 4. Depois, trabalhei um pouco a massa na pia, esticando para o alto e raspando a base com uma espátula por uns 5 minutos; tudo, muito rápido, pois uma massa com mais de 65% de água fica beeeeem grudenta. Ela perdeu um pouquinho do grude à medida que melhorou a textura. Por fim, usei, com alguma adaptação (trabalhei sobre a pia, não numa tigela), a técnica demonstrada neste vídeo, que a Bruna menciona em seu blog Pão com Levedura Natural.
Deixei fermentar até dobrar de volume, por cerca de 3 horas. Daí, dividi a massa em dois e formei dois boules como ensinado neste vídeo, também citado pela Bruna. A massa fermentou em minha adega por cerca de 6 horas a 14ºC. Daí eu acordei com a bela imagem ao lado e deixei a massa fermentar mais 1 hora à temperatura ambiente.
Mas não foi só o acréscimo de água que fez a diferença dos pães de hoje. Eu já havia desistido da ideia de usar em casa vapor ou qualquer técnica para substituí-lo, mas os comentários da Bruna e a paixão com que fala sobre usar panelas na hora de assar pão me instigaram novamente.
Eu já havia tentado essa técnica, mas não achei que fosse tudo isso. Agora, vejo que o problema lá no passado foi, na verdade, eu não ter acertado a massa. Algo que também me atrapalhou àquela época foi a maneira de transferir a massa para a panela: eu usei uma espátula de inox para transferir a massa da tábua de fermentação para a panela; o choque físico provocado pela “queda” fez a massa perder gás carbônico e murchar. Outra coisa que lembro de ter feito foi borrifar água em demasia. Resultado: pão murcho e sem graça.
Desta vez, usei duas cumbucas de inox de cerca de 15 cm de diâmetro, onde coloquei os boules formados; forrei as cumbucas com e polvilhei sobre os pães bastante farinha. Levei ao forno uma cumbuca por vez, que coloquei dentro de uma panela de inox preaquecida junto com a tampa no forno.
Os pães assaram por cerca de 20 minutos com a panela tampada e mais 20-30 minutos com a panela destampada, sempre à temperatura máxima do meu forno (o marcador registra 280ºC, mas acho que não é tudo isso) e a todo o tempo sob a supervisão do Hefesto, que não deixou ninguém abrir o forno sem ser convidado.
E o resultado foi este:
Os alvéolos maiores em relação à receita básica deste blog foram obtidos em função de dois fatores: uma massa mais úmida e a maneira de formar os pães. Na receita básica, a ideia é esticar a massa ao máximo, para que o pão seja formado com o máximo possível de voltas, o que contribui para a maciez do miolo. Mas a receita de pão branco super básico do blog Pão com Levedura Natural sugere o uso de técnicas da escola francesa, que procura preservar as bolhas de ar geradas na primeira (e, sempre que for o caso, na segunda) fermentação.
Para assar o pão da direita (com corte circular), acrescentei um pouco de água na panela, o que fez gerar vapor imediatamente e deixou o pão ligeiramente mais macio e com aspecto mais leve.
Mas qual a função do vapor mesmo?
Curiosamente, a principal função do vapor é evitar a formação de casca no pão, ou melhor, que a superfície do pão resseque ainda no início do assamento, mantendo, assim, a elasticidade da massa até que o pão se desenvolva. A presença de vapor ajuda a reduzir e estabilizar a temperatura do forno (a água evapora a 100ºC ao nível do mar), o que faz com que o pão praticamente cozinhe em vez de assar.
Você certamente já deve ter comprado um pãozinho francês cuja superfície tenha a textura parecida com a de um casaco de pele. Isso geralmente acontece quando o pão, já pronto, é retirado do forno e é abafado durante seu resfriamento. É mais ou menos assim que o pão fica enquanto está cozinhando no vapor. Nesse momento, por exemplo, a fenda aberta na massa crua na parte superior do pão se alarga, permitindo a máxima expansão do pão.
Após cessar a injeção de vapor, o ar dentro do forno resseca rapidamente e drena o máximo de umidade que conseguir do pão, até que a casca se forme, passando a atuar como um impermeabilizante de dentro para fora, retendo umidade no miolo. Além disso, sem vapor e com a casca ressecada, a superfície perde em elasticidade, o que acaba por limitar o crescimento do pão. Se houve tempo para o pão se desenvolver e expandir, o ressacamento da superfície agora já não é problema, mas solução, e o pão chegará a sua estrutura final.
O uso do vapor é efetivo somente se iniciado logo que o pão vai ao forno; passados alguns minutos sem vapor, não adianta desaguar um rio em vapor, que não vai servir para nada, pois a “pele” já terá ressecado. Nas padarias, a injeção de vapor é interrompida depois de 10 a 20 minutos. A partir desse momento, a “pele” começa a ressecar e a se transformar numa casca cujo efeito crocante durará mais do que no caso da casca de um pão que assou o tempo todo sem vapor.
Voltando à panela quente
A ideia de se usar uma panela tampada é justamente para emular um forno com injeção de vapor: a água fica recirculando no interior da panela, enquanto a massa cozinha. Assim que o pão cozinha e se desenvolve o suficiente, destampa-se a panela para liberar o vapor, consolidar o formato do pão e conferir-lhe cor e sabor, completando a chamada reação de Maillard.
Ok, ok, já entendi. Mas de onde vem o vapor quando se usa uma panela para assar pão?
Da própria massa de pão. Ao ser submetida ao calor do interior da panela, a massa irá transpirar, liberando água, que por conta da temperatura se transformará em vapor. Com a panela tampada, a perda de água será pequena e demorada, e a umidade irá recircular pela panela.
É evidente que esse processo de vaporização do pão terá melhor efeito se feito com injeção real de vapor, e não recirculação da umidade do pão. Mas tenho que confessar que o improviso da panela contribui muito para melhorar o aspecto visual, o aroma e o sabor do pão.
E por que não usar, em vez de panela, assadeira tampada?
E você acha que eu não iria tentar isso? Imagine ter de fazer só pães redondos e ou em dimensões que caibam na minha panela (que, por sinal, não é pequena). E minhas baguettes, meus batards, meus filões, como é que ficariam?
Para não perder a oportunidade e o embalo nos experimentos, resolvi testar assar pães numa assadeira tampada. Fiz mais uma massa, agora com o fermento “natural” que estou criando a partir de fermento biológico industrializado e com farinha de glúten. A receita ficou assim:
400 g de farinha de trigo
60 g de farinha de glúten
120 g de fermento “natural”
13,5 g de sal (já contando que o fermento natural continha 80 g de farinha de trigo)
320 g de água
Confira o resultado:
Se olhar bem, você vai perceber que o pão da esquerda abriu mais e ficou com um aspecto mais “profissional”. É que na verdade ele foi assado de maneira diversa à do pão da direita. Ele foi assado com a assadeira tampada com papel-alumínio.
Já o pão da direita foi assado usando uma forma de cerâmica como pedra refratária (deixei pelo menos 30 minutos preaquecendo, o que pela espessura da peça foi mais que suficiente) dentro de uma assadeira coberta com papel-alumínio.
Em suma, obtive um resultado melhor usando assadeira sobre assadeira.
Mas nem tudo é perfeito nesse mundo das panelas quentes…
Pois é, tem alguns senões usar panela no forno. Em primeiro lugar, essa técnica exigirá muita destreza e cuidado na hora de transferir o pão para a panela, principalmente se você não usar recipientes de metal como a cumbuca de inox acima. Destreza, para evitar choques na massa, o que poderia fazê-la perder o formato e até murchar. E cuidado, para não se queimar com a panela quentíssima.
Outra questão é o formato do pão, que deverá ser, via de regra, redondo, a não ser que seja uma microbaguete ou outras formas que caibam na sua panela.
E, a depender da altura do forno, você terá de assar os pães na grade mais baixa do forno, o que pode fazer com que o seu pão asse mais rápido na base do que no topo. Aí, de duas, uma: ou você faz um pão douradinho em cima mas marronzão embaixo, ou um pão douradinho embaixo e amarelão em cima.
Kkkkk
Muito boa essa narrativa .
Sempre fui assim .
Nao desisto facil e muitas vezes era pra ter desistido ne , mas uqem gosta do que faz , gosta de comer e gosta de ouvir aquele um que gostoso o seu produto . nao desiste mesmo.
Obrigado pelo post .
Parabéns e continuem assim e vamos pra cozinha galera…
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